SOBREVIVENDO NA INDEPENDÊNCIA - A covardia dos que querem viver
Em julho de 2017 iremos lançar o 5º DVD de show ao vivo das Velhas Virgens. Esse foi gravado no Love Story, uma ideia que a gente vinha acalentando fazia muito tempo e agora se tornou realidade.
Apesar da alegria do novo rebento, sentimentos muitos distintos e contraditórios se afloram em mim. Por um lado tem o meu orgulho particular de fazer parte de um belo trabalho. O disco está com ótima produção de som, luz e imagem., Está bem tocado, dentro dos nossos parâmetros, é claro, Tem show de lançamento marcado, data de estreia na TV, projeto para youtube e mídias digitais pronto. Tudo muito correto e contemporâneo.
Por outro lado ficou uma sensação finalizar um ciclo. Confesso que fiquei bastante assustado. Nunca tinha pensado nisso seriamente, mas será que chegou a hora de parar? Será que já cumprimos nosso papel e agora temos que partir pra outras aventuras?
Estou chegando nos 50 anos, uma idade em que não sou um completo velhote, mas estou longe de ser um garoto no auge da forma física e da força. O que ainda funciona perfeitamente é a cabeça e ela se põe a pensar.
Será que o discurso de liberdade através da da boêmia, da liberdade sexual e de liberdade de expressão perdeu o sentido?
Ou será que ele perdeu o sentido para nós? Será que cantar "Tudo que eu fiz foi lindo mas foi só pra te comer" com 50 anos não é mais libertário e sim constrangedoramente engraçado?
Será que o público ainda quer ouvir esse tipo de música? Será que ainda quer ouvir rock?
Já dizia o saudoso Belchior "o novo sempre vem" e eu sei disso. Sinto na carne todos os dias quando eu passo por algum lugar e esta tocando uma dessas músicas novas e eu tenho que conter a mesma reação de descontentamento do meu pai em relação aos discos que eu ouvia. Tenho que me controlar pra não achar tudo muito ruim e, pior que isso, controlar a certeza de que antigamente as coisas eram melhores. Eram o caralho! Minhas lembranças eram melhores. Saudosismo piegas de quando eu era jovem. O pior idiota é o que tem certeza!
Meu pai ouvia Edu Lobo e Tom Jobim. Eu estava na onda de Clash e Police. Claro que musicalmente falando não há comparação. Só que eu precisava da energia daquela música, coisa que ele não entendia. Simplesmente achava que meu gosto era duvidoso. E era mesmo. Qual garoto de 15 anos não tem o gosto duvidoso? Por isso eu faço um esforço pra não julgar essa garotada. Não é justo com eles nem comigo.
O novo sempre vem, dizia o bigodudo. Quer você queira ou não. Quer eu goste ou não.
É pensando nisso que tenho me perguntado sobre a relevância do que eu faço para o mundo? Será que precisam de mim? Será que só estou adiando o inevitável?
No final é uma dor. A dor de envelhecer, a dor de se perder num mundo novo, a dor de entender que seus conhecimentos e habilidades, cultivadas durante uma vida, não valem quase nada, a dor de ter que se reinventar. Fora a dor nas juntas da artrite começando a pegar, o fígado já meio estragado e outras coisinhas que é melhor não comentar. Viver dói e ponto.
Tem uma ponte no meu caminho até o metrô. Passo sempre por ela. Nos finais de semana que viajo com a banda e passo por ali de madrugada não há ninguém. Nem pedestres nem carros. Já parei algumas vezes sobre ela e me perguntei quais os motivos pra não pular.
Alguém ou alguma coisa dentro da minha cabeça fala baixinho. Sempre acho que é o personagem de Mickey Rourke em o Selvagem da Motocicleta que fala comigo:
"Rapaz, você sabe que não tem coragem.
Tem sempre aquela música que você queria fazer, uma história pra contar, o filho pra ver crescer.
Você tem a covardia dos que querem viver."
Me magoa um pouco saber que o Selvagem da Motocicleta me toma por covarde, mas também me empurra pra frente.
No fundo é a minha vida, escolhi não fazer nada que eu não goste e isso tem um preço alto.
Velhas Virgens 1987 |
Velhas Virgens 2017 |
Tenho tantas e todas as mesmas duvidas que vc tem pois cheguei aos 50 anos (já são 51 e em breve, 52) antes de vc. Não vejo covardia em desistir e nem sequer em pensar em pular da ponte. Assim como não vejo coragem. Todos estes questionamentos (ou quase todos) passaram na minha cabeça e se foram. Eu mesmo já anunciei que ia parar e voltei atrás. Quis parar por não ver um caminho pra seguir. Desisti porque o caminho reapareceu. No fim tudo é temporário, como a própria vida, então a gente segue dançando mesmo quando erra o passo. Poucos percebem , pois tb estão as voltas com suas danças pessoais. Ao contrário de vc, não escolhi fazer só o que gosto, mas tentar gostar de tudo que faço. Não é melhor e nem pior, só diferente. Acho que o tempo e a compreensão promovem crises, mesmo. Queria ser burro, não sofria tanto, disse outro barbudo (Raul). Na dúvida, sigamos em frente. Há muito o que fazer. Em breve saberemos. Seja como for, conhecer vc mudou minha vida. E isso não tem preço, cumpadi! Finalizo citando Caetano: Alegria, alegria!
ResponderExcluirSábias palavras!
ExcluirPuta texto! Cara, tenho me questionado muito sobre as mesmas coisas e eu também escolhi fazer só o que gosto. Pago o preço por isso feliz.
ResponderExcluirMas uma hora dessas essa névoa se dissipa e, como disse o Paulão, sigamos.
Valeu, Roger!!!
ExcluirA gente vai deixando conceitos pra trás e isso machuca; a gente vai se indignando com outras coisas e isso dói menos; a gente vai se adaptando mais e se reconforta em coisas que antes traziam incômodo; chega uma hora que a gente pega pra olhar pra gente e não sabe se sente mais ou menos, mas que haja sempre um sentir... Que por ora, seja o desconforto do reflexo no espelho (afinal, quando ele foi confortável, não é?)
ResponderExcluirE se no final, tudo o que vocês tiverem conquistado foram os amores em família e uma banda que embalou outros amores (mesmo que o pela cerveja e pela boemia), há de se exaltar o nosso imenso muito obrigado pela existência, pois...