GARÇONS DO INFERNO (Coletânea) Em 2015 a banda estava morrendo e eu podia sentir os Garçons do Inferno vindo nos buscar


Os 30 anos das Velhas ia se aproximando e a banda estava em franca decadência. Duro dizer que em 2015 parecia que havíamos chegado ao final do ciclo.

Capa do "Garçons do Inferno" - Arte de Weberson Santiago e design Ju Vechi 

Acredito que passar mais de 25 anos emendando turnê atrás de turnê, sem nunca tirar férias, sem parar de gravar, enfim sem parar de trabalhar, tenha minado as forças da banda, tolhido nossa criatividade. A gente envelhecia e a força física não era a mesma. Não me entendam mal. Fizemos o que podíamos, porém não tirar férias, não ficar um pouco longe um do outro tinha desgastado nossas relações como banda e amigos. Sem grana e sem a amizade de antes seria impossível continuar.

Sempre achei que, ao chegar aos 30 anos de carreira, a gente teria prestígio e grana pra fazer um puta álbum novo e renovado, alguma coisa muito foda, louca e artística. A verdade é que chegávamos nesse ponto da carreira e não havia grana ou prestígio pra fazer merda nenhuma. A Gabaju (minha empresa e gravadora das Velhas) se encontrava em uma situação terrível, já que vivia de venda de discos e isso havia acabado. Eu não havia feito nenhum acordo sobre streamings com o Paulão para a Gabaju. A conclusão é que toda a grana que entrava ia para os compositores das músicas e nada para a gravadora. Todo o investimento em gravações e tantas outras coisas tinha se tornado nada. Sem receita não havia como investir em novidades. Eu iria usar meus últimos recursos para apagar a luz e fechar a porta. A gente caminhava a passos largos para um final lamentável e eu estava falido.

Minha vida nessa época era um caos. Minha mãe havia morrido e eu tinha deixado de lado quase todas minhas obrigações pra passar, junto com ela, seus últimos meses no hospital. Minha cabeça não estava em condições então deixei que tomassem decisões por mim e isso piorou muito a situação. Eu estava sem grana, sem trabalho e com um filho pequeno. Me forcei a sair do buraco, pensar com clareza e a começar a procurar coisas pra fazer. Tentava conciliar ganhar alguma grana com um último projeto com as Velhas. Foi um período triste que durou mais de dois anos.

Velhas em 2015 - Filipe Cirilo, Ale Cavalo, Paulão, Ju, Simon e Tuca
Esses aventais fizeram muito sucesso entre os fãs!

Acabei tendo uma ideia que poderia adiar um pouco essa morte anunciada. Não era a salvação, mas um paliativo que poderia nos dar um tempo pra recuperara as forças, e só a gente sabe como precisávamos desse tempo. Tinha muita coisa dentro da banda que precisava ser recuperada.

A ideia era fazer uma coletânea, nesses 30 anos de banda a gente ainda não tinha feito um disco que tivesse as “mais famosas músicas do underground que não tocaram em lugar nenhum”. E para isso bolei uma pesquisa com os fãs que escolheriam as 20 músicas que mais gostavam. A gente faria esse CD que teria muito pouco custo e, ao mesmo tempo, uma turnê com as melhores músicas escolhidas por quem gostava da gente. Podia dar certo, dar um pouco de grana, levantar nossa moral e ainda o tempo necessário pra recomeçar.


A galera escolheu as músicas (foi bem complicado computar todos os votos), o Weberson fez a ilustração da capa e a Ju Vechi criou toda uma nova roupagem pra banda. Chamamos o disco de “Garçons do Inferno”, um novo guitarrista, Filipe Cirilo, se juntou à banda e caímos na estrada novamente com nova turnê.







Funcionou por um breve período. Os problemas permaneciam, o desgaste também, o doente continuava muito doente, não era a salvação. Como eu havia dito, apenas um paliativo. Foi uma turnê razoável até que rompemos com nosso empresário. Uma briga séria entre ele e nós acabou de azedar uma relação que já não vinha bem.


Tinha conseguido um tempo que só mostrou que chegava o fim da linha. Sem perspectiva, Paulão entrou numas de querer parar, que acabaria a turnê e depois daria um tempo. Eu sabia que esse tempo não teria volta. Ele achou que isso serviria para dar mais visibilidade pra banda, só que isso teve efeito contrário, acabou de derrubar todo mundo.

No momento em que tudo parecia perdido uma luz se acendeu bem no final do túnel. Mas essa é uma outra história que contarei no próximo capítulo.

Comentários

  1. Putz, acompanhei pela mídia essa fase das Velhas e o que mais ouvi falar foi sobre a iminente saída do Paulão, aparentemente por "esgotamento" da banda (quem curte ler sobre bandas de rock sabe dos desgastes causados por muitas turnês, convívio excessivo, vaidades, grana, diferenças quanto aos rumos a seguir e etc etc), mas eu não consegui avaliar a profundidade da "crise". Eu tinha curtido muito o "Todos Os Dias A Cerveja Salva A Minha Vida!" de 2014 (e participado do 'crowd funding') e não conseguia imaginar o fim das VV. Para mim, "Garçons do Inferno" em 2015 era apenas uma coletânea natural de 30 anos, merecida, como várias bandas fizeram e refizeram ao longo de décadas via seu depto. de mkt... estou muito curioso com a continuação desse relato!

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